St. Vincent e Grenadines por
Marcus Coltro |
Depois de vários anos viajando com Tony McCleery, tendo
fantásticas aventuras em locais exóticos, ele me
informou de sua decisão de vender seu veleiro. Então
me convidou para viajar uma última vez para Granada e velejar
até St. Vincent e Granadinas no Caribe. Seria uma jornada
de 13 dias no veleiro Marina Em, parando em várias ilhas
no caminho.
Saí de São Paulo e passei por Miami para visitar
meu irmão Marcello por alguns dias. No dia de minha saída
para Granada levantei cedo e fui para o aeroporto. Chegando lá
tive uma notícia desagradável:
- Onde está seu visto para Granada?
- Que visto?!?!?
- Bem, se você não tem visto não pode viajar,
não lhe avisaram ao embarcar em São Paulo?
Aparentemente, American Airlines se esqueceu de me avisar deste
"pequeno" detalhe. Então voltei para a casa do
Marcello e procurei na internet como conseguir este @#%#@$ visto.
Eles têm representação em Miami (não
exatamente um Consulado), e cobram 100 dólares pelo visto
- o problema é que pedem vários dias para aprová-lo!
Tive que mudar meus planos, então liguei para a American
Airlines para mudar o vôo para San Juan em Porto Rico onde
eu pegaria outro vôo da Liat Airlines para St. Vincent.
A American quis me cobrar uma taxa de 170 dólares para
efetuar a mudança da passagem - então educadamente
pedi para falar com o supervisor e disse que só pagaria
quando o inferno congelasse - afinal, a culpa da minha viagem
ter dado errada foi deles. Não paguei nada e marquei o
vôo para alguns dias depois.
Liguei para o Tony - desta vez ele estava com um celular no barco
- e expliquei a mudança dos planos. Ele ficou desapontado
já que havia planejado toda a viagem para mim. Ele teve
que velejar de Granada para St. Vincent para me encontrar lá.
Seria uma viagem longa e o mar estava bem revolto, mas ele chegou
a tempo.
Enquanto isso tive que encontrar algo para fazer com os dias
livres que antecediam meu vôo. Lembrei que meu amigo Randy
Allamand havia me convidado para visitá-lo em Sebring na
região central da Flórida. Marquei a visita e dirigi
até sua casa na manhã seguinte (3 longas horas em
uma estrada tediosa...). Pelo menos pude trocar muita coisa interessante
com ele.
Na terça de manhã saí de Miami para San
Juan, e de lá peguei outro vôo para St. Vincent.
Teria que pegar um ferry-boat para encontrar com o Tony em Bequia
(uma hora de viagem), contudo o próximo ferry somente sairia
no dia seguinte. Então passei a noite em St. Vincent em
um pequeno hotel chamado Crystal Heights, pertencente à
Sra. Virginia Phillips. Ela foi bem gentil, inclusive me recebeu
com um sanduíche de atum e uma cerveja! Ainda bem, não
havia absolutamente nada por perto para comer....
Cheguei ao ferry bem cedo e em Bequia às 8:45h. O Tony
estava me esperando no cais, de lá fomos até as
autoridades para incluir meu nome na relação de
passageiros do veleiro, e fomos comprar mantimentos para a viagem,
pão, enlatados, álcool para as conchas (e para nós
também, o estoque de cerveja do Tony estava no fim...).
Embarcamos e assim que me instalei fui mergulhar. Encontrei diversas
conchas como Cyphoma gibbosum, Astraea tecta, Coralliophila abbreviate
e caribbea, Vasum capitellum e alguns Conus jaspideus. À
tarde planejamos o itinerário da viagem juntos - depois
do meu problema com a passagem tudo teve que mudar. Colocamos
a conversa em dia, ele também me explicou os motivos da
venda do veleiro. Ele já havia mais ou menos me colocado
a par no ano passado - e para fechar sua decisão ele teve
uma péssima experiência em novembro passado. Enquanto
estava na Venezuela seu barco foi invadido por piratas! Teve suas
mãos amarradas e os olhos vendados - o tempo todo com uma
arma apontada para sua garganta. Roubaram todos os computadores,
máquinas fotográficas e vários objetos que
encontraram pelo barco. Felizmente não queriam chamar a
atenção dos barcos ancorados perto, então
não o agrediram nem dispararam a arma. Para a sorte do
Tony eles também não eram muito espertos - não
conseguiram entender para que servia o microscópio e nem
perceberam que havia uma máquina fotográfica presa
nele - o conjunto custa mais que tudo o que levaram!
O local onde ancoramos - Admiralty's Bay - era bonito, mas balançava
um pouco. Eu havia me preparado com Dramin nos dias anteriores
então não tive problemas. De lá navegamos
para Ilha Quatre e no caminho dragamos e encontramos algumas conchas
interessantes.
Há vários anos o Tony encontrou diversos Conus
cedonulli em Quatre - e esta concha era um de meus motivos para
mergulhar nesta região. Todos os colecionadores que conversei
me disseram que teria que mergulhar à noite e pelo menos
a 20 metros de profundidade. O Tony não poderia me acompanhar,
pois estava ocupado no barco, sem contar que aos 75 anos não
teria pique para mergulhar todos os dias.
Não estou habituado a mergulhar em profundidades maiores
que 20 metros, então fiz questão de mergulhar durante
o dia para ver como seria o local antes de mergulhar à
noite.
À noite me preparei para o mergulho solo - o Tony criou
um sistema de segurança que apreciei bastante: colocou
uma corda com 200 metros dentro de um balde de onde poderia ser
puxada com facilidade. Desci com a corda em meu pulso e fui até
o fim. Lá deixei a corda e voltei em zig zag à sua
volta para cobrir uma área maior. Não encontrei
quase nada a 20 metros, somente algumas Pyramidella dolabrata
(deveria cobrar 100 dólares por cada!)
Levantamos cedo e após o café da manhã mergulhei
novamente. Encontrei mais algumas conchas sob pedras e voltei
logo para o barco para podermos navegar para outro lugar. Fomos
a Mustique - uma pequena ilha particular onde a realeza e pessoas
famosas passam suas férias (como Mick Jagger, Princess
Margareth, David Bowie, Shania Twain, Kate Moss...). Como chegamos
no fim da tarde eu não pude verificar o local antes do
meu mergulho noturno, mas iria realizá-lo de qualquer forma.
Tudo checado e pronto (mais tarde percebi que não foi bem
assim...). Desci as escadas do veleiro e tentei submergir. Alguma
coisa estava errada já que não conseguia afundar
- será que havia perdido algum lastro de meu cinto? Forcei
a descida e quando cheguei a 20 metros chequei o manômetro
para ver se a garrafa estava ok: não, ela estava completamente
vazia! Por isso não afundava, a garrafa sem ar flutua!
Eu poderia respirar no máximo duas ou três vezes
para subir antes que todo o ar acabasse, então comecei
a nadar o mais rápido possível - soltando todo o
ar para que meus pulmões não explodissem quando
o mesmo expandisse na subida. O problema é que o ar acabou
completamente quando eu ainda estava a uns 10 ou 15 metros! Aqueles
segundos restantes pareciam não acabar nunca e eu já
estava me sentindo meio tonto. Só não vi minha vida
passar em frente aos meus olhos porque estava escuro lá
em baixo... Pelo menos fiquei satisfeito de ter lembrado o que
aprendi no curso de mergulho que fiz há vinte anos, não
soltei o lastro nem prendi a respiração por mais
que sentisse que precisava do ar. Sei que existe uma pequena linha
que divide coragem da estupidez, acho que naquela noite eu passei
para o outro lado. O pior é que não encontrei nenhum
maledeto Conus lá em baixo! Ao chegar percebemos que a
válvula daquela garrafa estava com defeito e deixou todo
o ar escapar durante o dia.
Dormi feito uma pedra, apenas com uma leve dor de cabeça.
Na manhã seguinte fui mergulhar novamente - após
me certificar que não havia tido nenhum efeito colateral
à parte da baba no travesseiro.
Mergulhei em baixo do barco e fui em direção ao
recife que ficava próximo à praia. Encontrei algumas
conchas e percebi que ali seria um bom local para mergulhar à
tarde. Voltei para almoçar - nossa refeição
de luxo, um sanduíche de atum, maionese, cebola e queijo
ralado. Tirei uma soneca e mergulhei novamente. Encontrei mais
algumas conchas como Cypraea cinerea, Lima lima, Conus jaspideus,
Astraea tecta, Trivia pediculus e outras conchas pequenas.
Não havia esquecido de meu probleminha na noite anterior,
mas tinha que mergulhar à noite novamente.
Desta vez me certifiquei que tudo estava certo e desci - só
que não encontrei nada a não ser as Pyramidella
dolabrata. Que poderia estar acontecendo? O local e a profundidade
estavam corretos mas os Conus não estavam lá!
Voltamos para Bequia no dia seguinte e dragamos no caminho. O
Tony ancorou próximo ao paredão assim eu poderia
mergulhar diretamente do barco sem ter que me deslocar usando
o bote. À tarde fui checar o local para meu mergulho noturno
e encontrei algumas Marginellas a 24 metros. O problema em mergulhar
fundo é o curto tempo que teria para procurar conchas,
teria que ser rápido para cobrir uma área maior
possível. Novamente, nada de Conus.
Eu iria voltar a Miami em dois dias então navegamos para
St. Vincent. O local parecia bom e promissor. Um pouco mais profundo
que os anteriores, mas a água estava morna e limpa. À
tarde mergulhei e fui até 32 metros - finalmente encontrei
um Conus cedonulli! Estava certo de que encontraria mais à
noite - mas não achei nem um exemplar!
Então desisti dos mergulhos profundos e iria dedicar o
restante do tempo em águas rasas, ao menos encontraria
mais material. Desta vez o Tony me acompanhou e mergulhamos próximo
à praia - adivinhe?
Encontramos vários Conus cedonulli! Infelizmente eu somente
teria mais um dia para mergulhar ali e só puder encontrar
alguns poucos no dia seguinte.
No dia de minha partida o Tony me levou à marina onde
eu tomaria um táxi para o aeroporto.
Despedi-me pela última vez, e me lembrei de todas a viagens
a bordo do Marina Em, foram dias maravilhosos não somente
pelas conchas mas pela experiência que adquiri. Obrigado,
Tony!
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